Candidatos ignoram maior crise hídrica da história, diz ambientalista

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Para diretor da SOS Mata Atlântica, falta de atenção à questão nas campanhas expõe retrocesso na agenda ambiental do País


BBC Brasil

Embora o Brasil viva a maior crise hídrica de sua história, o tema está à margem do debate eleitoral, afirma o geógrafo Mário Mantovani, diretor da organização SOS Mata Altântica.

"Nenhum candidato tem dado à questão a atenção que ela merece, o que diz muito sobre o forte retrocesso que tem havido na agenda ambiental brasileira", ele afirma. A crise hídrica só entrou no debate eleitoral nos estados que enfrentam situação mais crítica, como São Paulo.

Em entrevista à BBC Brasil, Mantovani cita duas ações humanas que, segundo ele, ajudam a explicar o cenário atual. Uma delas é o desmatamento na Amazônia, que teria alterado o regime de chuvas no Centro-Sul do país. A outra, o afrouxamento das regras de proteção florestal nas margens de rios, chancelada pelo novo Código Florestal.

"Desde 1973, não conheço momento que foi pior para o meio ambiente. Este governo riscou o setor ambiental do mapa", diz Mantovani. Segundo ele, a presidente Dilma Rousseff encara a área unicamente como empecilho para a autorização de grandes obras.

O governo federal rejeita as críticas (leia abaixo a resposta do secretário Executivo do Meio Ambiente, Francisco Gaetani).

A SOS Mata Atlântica elaborou 14 propostas para os presidenciáveis. Das quatro que tratam da gestão das águas, Mantovani destaca duas: incluir a sociedade nos comitês que gerem as bacias hidrográficas e cobrar pelo uso de água de todos os usuários, especialmente agricultores. Hoje isento de custos, o grupo é responsável por 80% do consumo de água no país, segundo ele.

A BBC Brasil entrevistou Mantovani na mesma semana em que três notícias agravaram as preocupações com a crise hídrica nacional. Em Minas, o diretor do Parque Nacional da Serra da Canastra, Luiz Arthur Castanheira, anunciou que a principal nascente do rio São Francisco secou; em Itu (SP), um protesto contra a falta d'água terminou em confronto com a polícia militar; e o pesquisador da Unicamp, Antônio Carlos Zuffo, afirmou que água do sistema Cantareira, principal fonte de abastecimento da cidade de São Paulo, pode acabar em 50 dias. Veja os principais trechos da entrevista:

BBC Brasil - Você escreveu que a crise hídrica é no fundo uma crise ambiental. Por quê?

Mário Mantovani: Essa crise mostrou que APP (Área de Preservação Permanente) de cinco metros nas beiras de rio, a "escadinha" que o Ministério do Meio Ambiente propôs no Código Florestal, era uma farsa. Não pode haver no mesmo rio um proprietário com cinco metros de proteção, outro com 30 metros e outro com 15.

Aqueles torrões secos nas imagens das represas são causados por erosão laminar. São filos que vão se depositando conforme a água baixa e formam blocos. Foi a primeira vez que a hidrovia do Tietê parou em São Paulo. O rio está sem proteção.

Todo ano temos 20 centímetros de erosão laminar na hidrovia. Em dez anos, são dois metros de terra que vão parar dentro da represa. Na mesma represa, em Avanhandava, por causa do adubo que se usa e que vai parar na água, a proliferação de algas é violentíssima.

Outro problema é que no sistema Cantateira (principal fonte de abastecimento da cidade de São Paulo), assim como em qualquer parte do Brasil, 80% da água é usada para a agricultura. O Brasil exporta água em forma de produtos agrícolas, mas essa conta não é feita. A água não é um insumo que tenha valor.

BBC Brasil – Como resolver esse problema?

Mário Mantovani: Se a bacia tiver estresse hídrico, o comitê que faz sua gestão tem que dar menos outorgas para a agricultura. Há pivôs (máquinas para irrigação) no Brasil sem nenhum controle. Na região metropolitana de São Paulo, nas cabeceiras do Tietê, onde a água é pouca, não existe um cadastro dos irrigantes.

Quando o Banco do Brasil financia um agricultor na beira d'água, tem que cobrar que ele faça curva de nível, terraçamento, que cuide da Reserva Legal, da APP.

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