MP de Contas quer auditoria para apontar responsáveis pela crise hídrica do DF

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Questionado em 2014, então presidente da Adasa negou risco de racionamento. Gasto com publicidade superou ações para evitar seca, dizem procuradores.


Por Gabriel Luiz | G1 DF


O Ministério Público pediu que o Tribunal de Contas do Distrito Federal autorize uma auditoria para identificar órgãos e gestores responsáveis pela maior crise hídrica da capital. Até esta sexta-feira (31), o tribunal ainda analisava o pedido do MP de Contas, que deu entrada em 15 de março. Questionadas, a Agência Reguladora das Águas do DF (Adasa) e a Caesb disseram não terem sido notificadas sobre o processo. 

Barragem do Descoberto (Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília)
Barragem do Descoberto (Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília) 

O G1 teve acesso, com exclusividade, à representação do MP de Contas. O argumento dos procuradores é de que a principal culpada pela crise é a má gestão pública – mais, até, que as condições meteorológicas e o aumento do consumo. Segundo o texto, “a atual situação hídrica do DF parece indicar que o tema não teve a atenção merecida por parte das autoridades locais”.

Auditorias anteriores do Tribunal de Contas – que, já em 2009, alertavam o governo sobre o risco de racionamento – são relembradas. Entre os pontos levantados pelos procuradores está uma declaração do ex-presidente da Adasa, Vinicius Benevides, em 2014. À época, o então chefe da agência descartou qualquer risco de o DF "ficar na seca".

“Há mais de quatro anos, não se verificou falta de abastecimento entre a demanda e a produção de água, ou indisponibilidade de recurso hídrico. As previsões feitas e acompanhadas por nossos especialistas em recursos hídricos e saneamento, bem como por consultores da área têm demonstrado não haver este desbalanceamento”, respondeu Benevides ao ser questionado pelo Tribunal de Contas.

Para o MP, as declarações indicam uma mudança radical de discurso, quando comparadas com o cenário atual do DF. Segundo o órgão, isso mostra que a agência não “promoveu a gestão adequada dos reservatórios”.

“Ou seja, há pouco tempo, no ano de 2014, a Adasa asseverou textualmente, após questionamento objetivo do tribunal, inexistir previsão de desabastecimento em médio e longo prazo, para, três anos depois, apontar que a situação hídrica é gravíssima”, diz o MP de Contas.

Argumentos refutados

No entendimento dos procuradores, o argumento de que o consumo de água aumentou, enquanto as chuvas diminuíram, não justifica a atual crise hídrica. De acordo com o parecer, o consumo por habitante, na verdade, diminuiu – passando de 174,43 litros por dia, em 2011, para 152,04 litros por dia, em 2015.

“Nesse mesmo sentido, [...] a Caesb apontou [em questionamentos anteriores] que o crescimento econômico mais lento, eficácia de campanhas de esclarecimento da população e melhor controle de perdas permitiram postergar a necessidade de ampliação do sistema produtor de água”, diz o parecer.

Por isso, o MP de Contas diz não enxergar relação “direta e inequívoca entre aumento de consumo e diminuição drástica da capacidade dos reservatórios, principalmente com relação ao do sistema Descoberto”.

Quando analisadas as quantidades de chuvas, o órgão afirma que não houve alteração anormal no nível de precipitações. “Em muitas ocasiões dentro do referido lapso temporal inclusive, o índice de chuvas superou em muito a média histórica do período”, afirmam os procuradores.

“Diante dos dados colhidos, o que se alcança é que as chuvas tiveram unicamente uma discreta diminuição, sendo incapaz, isoladamente, de ser a causa exclusiva da atual crise hídrica que assola do DF.”

Com esses argumentos, o MP de Contas afirma que a crise vem principalmente da “falha na gestão dos recursos hídricos, que pode ter se originado, dentre outros fatores, de um planejamento ineficiente, da má gestão dos recursos financeiros disponíveis ou até de ações tecnicamente inadequadas”.

Falhas do GDF


Uma dessas falhas apontadas é o fato de a Adasa conceder outorgas para captação de água, mas sem o governo cobrar nada em troca. Isso mesmo depois de o GDF já ter sido chamado à atenção.

Em 2004, o MP de Contas já alertava: “A não adoção de medidas para implementar a cobrança pela utilização de água subterrânea no DF serve como incentivo para a continuidade do uso indiscriminado, que poderá acarretar, no futuro, problemas de abastecimento”.

Outro erro do governo, na visão dos procuradores, é gastar mais dinheiro com publicidade do que em ações práticas para prevenir a crise hídrica. Desde 2009 até 2016, a Adasa aplicou cerca de R$ 15 milhões em campanhas de publicidade e propaganda – quase um quarto dos R$ 80 milhões que tinha no orçamento, já tirando gastos com custeio e com pessoal.

Do outro lado da moeda, a Adasa gastou apenas R$ 2,8 milhões com “gerenciamento dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário”; R$ 3,5 milhões com “fortalecimento e reestruturação do sistema de monitoramento dos recursos hídricos”; R$ 5,4 milhões com implantação de projeto de meio ambiente”, e R$ 6,6 milhões com “implantação de unidade de gerenciamento”.

“Entende o Ministério Público que a quantia gasta em publicidade foi desarrazoada e desconectada da realidade e, talvez, tenha contribuído pelas previsões falhas que a agência fez ao longo dos anos, em que pese ter recebido alta quantidade de recursos, superiores, inclusive, a órgãos como Administração Regional de Taguatinga e Companhia de Desenvolvimento da Habitação do DF (Codhab) [em 2016].”

O critério que a Adasa tem para priorizar o orçamento leva então o MP a entender que “a agência, a despeito de deter as competências necessárias para agir, contribuiu para a atual crise desabastecimento de água”. “Pior, durante diversas ocasiões, assentou que tal possibilidade não existia.”

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