Caetité não quer o urânio da Marinha

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Moradores de cidade baiana barram a entrada de material radioativo que seria enviado à Europa para ser enriquecido

Vinicius Sassine - Correio Braziliense

 

Pela primeira vez na história do programa nuclear brasileiro, uma carga com 92t de urânio percorreu por terra um percurso de 1,5 mil quilômetros entre Iperó (SP) e Caetité (BA). O material radioativo, transportado em nove carretas, foi emprestado pelo Centro Experimental de Aramar, da Marinha, para as Indústrias Nucleares do Brasil (INB), estatal responsável pela extração do urânio e pela fabricação do combustível usado nas usinas nucleares Angra 1 e Angra 2, em Angra dos Reis (RJ). A carga, no entanto, chegou sem qualquer aviso à cidade baiana na noite de domingo, o que gerou um protesto dos moradores. Cerca de 3 mil pessoas formaram um cordão humano e impediram a entrada do material radioativo na cidade.
 
Diante do bloqueio, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a Polícia Militar conduziram o comboio de carretas para o Batalhão da PM em Guanambi, a 40 quilômetros de Caetité. A carga de urânio está parada no local e, até o início da noite de ontem, não se sabia o que fazer com o minério. “A cidade está em pânico. Aqui não se produz urânio e não queremos isso”, afirma o prefeito de Guanambi, Charles Fernandes.

 
O empréstimo foi a saída improvisada pelo governo para contornar a necessidade de importação de 220t de urânio em razão de licenças travadas na Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), como o Correio revelou em março. A INB decidiu transportar o urânio até Caetité para colocá-lo em tambores e, então, encaminhá-lo à Europa, onde seria convertido, enriquecido e retornaria ao Brasil.

 
O urânio é usualmente extraído da mina em Caetité e levado diretamente para o porto em Salvador, de onde segue para a Europa. A necessidade de o Brasil importar urânio, a um custo de R$ 25 milhões, chegou à mesa da presidente Dilma Rousseff logo no início de seu mandato. O atraso do licenciamento levou à necessidade de importação, o que gerou uma crise no programa nuclear brasileiro.

 
Comboio acompanhado
 

Para evitar a compra de todo o urânio, a Marinha e a INB assinaram um contrato de empréstimo.
 
As 92 toneladas devem retornar ao Centro de Aramar entre 2011 e 2016. O objetivo do programa nuclear em Aramar é construir um reator nuclear para propulsão de submarinos. “Não há recursos financeiros envolvidos nesse acordo”, informa o diretor do Centro de Comunicação Social da Marinha, o contraalmirante Paulo Mauricio Farias Alves. O presidente da INB, Alfredo Tranjan Filho, afirma que o transporte do urânio foi licenciado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pela Cnen. “O que houve foi um mal-entendido em Caetité. A população achou que era lixo atômico.”

 
O Ibama não confirmou a emissão da licença à INB. Já a Cnen diz, por meio de nota, que a transferência do urânio foi “devidamente aprovada”. “A Cnen aprovou o plano de proteção física da operação de transporte e também emitiu a autorização para transferência de material nuclear.” Ainda segundo o órgão, a PRF e “equipes de proteção radiológica” acompanharam o comboio de caminhões.

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