Chuvas continuam castigando Santa Catarina. Número de mortos chega a 84

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Da redação

Um estado em colapso, que chora seus mortos enquanto tenta resgatar sobreviventes. Na luta contra os estragos provocados pelos temporais, Santa Catarina mais parece um cenário de guerra. Falta água para a população beber, remédios, o preço do pão chega a R$ 3, supermercados e farmácias estão sendo saqueados. Milhares de pessoas continuam sem energia elétrica. O número de vítimas de deslizamentos de terra subiu para 84, 21 a mais que do que apontava o balanço da Defesa Civil catarinense na segunda-feira. Há estimativa de que cerca de 30 pessoas estejam desaparecidas, o que pode fazer com que o número de mortos seja maior que 100. Blumenau, terceira cidade mais populosa do estado e importante pólo industrial, levará pelo menos um ano para ser reconstruída, na previsão do prefeito do município, João Paulo Kleinubing (DEM).

No prédio do Serviço Social da Indústria (Sesi) da cidade, um misto de esperança e desespero move as pessoas. Famílias aguardavam ansiosas o pouso de helicópteros do Exército na manhã de ontem. Entre os abrigados no local, estava Irene Rinco. A cada chegada da aeronave, crescia a expectativa de reencontrar o irmão, Oswin Denner. “Não falo com ele desde o domingo à tarde. Não sei o que pode ter acontecido”, temia.

A salvação também chegou para centenas de turistas que estavam isolados há três dias num parque em meio à Mata Atlântica, na região do Vale do Itajaí. Eles foram localizados e resgatados por bombeiros, policiais militares e soldados do Exército, numa ação dramática. A equipe teve de improvisar uma ponte pênsil sobre gigantescas rachaduras abertas no morro, que impediam a saída dos turistas. Os visitantes, mais de 600, são estudantes e professores de diversas cidades catarinenses, paranaenses e paulistas. Eles tinham escolhido o Parque Aquático Cascanéia, no município de Gaspar, para comemorar a formatura no terceiro ano do ensino médio.

Entretanto, o passeio se transformou em pesadelo, quando o temporal desabou sobre Gaspar no último fim de semana. A única estrada de saída do parque ficou obstruída. Os estudantes ficaram no topo de um morro, abrigados num salão de festas. “As piscinas foram soterradas por lama, faltou luz e a saída era jogar cartas”, resumiu Michel de Souza, 17 anos, aluno do terceiro ano do ensino médio.

Sede e fome

Oito cidades permanecem isoladas. Além dos mais de 54 mil desabrigados e desalojados. A Defesa Civil divulgou uma linha telefônica e endereços de delegacias para registro de ocorrências.

Diante do caos da falta de água, a Secretaria de Saúde estadual divulgou um comunicado orientando as pessoas com acesso a piscinas tratadas com cloro para utilizar a água para beber e preparar alimentos, desde que fervida por 10 minutos. Um apelo para que pessoas e empresas doem água potável nas sedes da Defesa Civil de todo estado. Já foram repassados à população, de acordo com o órgão, 55 mil litros.

A combinação de fome e desespero proporcionou ontem à tarde, em Itajaí, a cena mais transparente da calamidade em que se encontra a cidade portuária, por causa da enchente. Mais de um mil flagelados arrombaram o portão e romperam o cordão de isolamento formado por 20 policiais militares para entrar em um megaatacado de 8 mil metros quadrados, no Bairro São Vicente. Levaram tudo o que podiam. Foi o terceiro estabelecimento saqueado em menos de 24h. Outros dois supermercados que também estavam fechados foram invadidos na cidade.

No meio dos produtos angariados, a carne descongelada, por causa da falta de energia elétrica no bairro, lembrava pelo cheiro o quanto é perecível. Para chegar aos portões, moradores atraídos pela notícia de comida grátis beiravam o descontrole, chegando em barcos, botes infláveis e a nado, sobre pedaços de madeira. Da porta para dentro, nem a escuridão no atacado fazia errar o caminho até as prateleiras. Os mais solidários as escalavam, como se fossem prédios, e lançavam para baixo as caixas fechadas. “Pega leite para mim?”, gritava uma mulher.

Em Ilhota, umas das cidades com maior número de vítimas — até ontem eram 18 —, cada pouso de helicóptero no campo de futebol municipal levava uma multidão ansiosa até a cerca. Sujos de lama, com o rosto de espanto e sofrimento, desciam os sobreviventes de um deslizamento na localidade do Morro do Baú, a 20km do centro da cidade. O acesso ao local só pode ser feito por aeronave. A Defesa Civil estimava ontem que 160 pessoas esperavam ajuda no lugar.

Dificuldades

As chuvas incessantes dificultam não só o trabalho de resgate como também os trabalhos de desobstrução das pistas, a volta do fornecimento de energia e água e a manutenção de serviços básicos, como a entrega de correspondência. Os Correios suspenderam ontem os serviços de Sedex 10 e Sedex no estado.

Um deslizamento de terra no começo da manhã atrapalhou os trabalhos de reparo na rede elétrica em Blumenau, onde cerca de 137 mil residências permaneciam sem luz. Em todo o estado, a energia elétrica ainda não foi recuperada em 106 mil casas. A obstrução de rodovias é outro fator agravante da situação. Ontem, restavam 12 rodovias com bloqueio total, sendo oito estaduais e quatro federais.

Os municípios de Gaspar, Rio dos Cedros, Nova Trento e Camboriú, em Santa Catarina, declararam estado de calamidade pública. Outros oito estão em emergência: Balneário de Piçarras, Canelinha, Indaial, Nova Trento, Penha, Paulo Lopes, Presidente Getúlio e Rancho Queimado.

Continuam isolados os municípios de São Bonifácio, Luiz Alves, São João Batista, Rio dos Cedros, Garuva, Pomerode, Itapoá e Benedito Novo.

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