'Febre' do óleo de palma no Peru ameaça a Amazônia ancestral

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O surgimento do óleo de palma no dia a dia das comunidades indígenas do Peru abalou milhares de pessoas que podem perder suas casas e até mesmo suas vidas


Javier Romualdo | EFE

Enquanto as florestas do Peru se transformam em novos mananciais de óleo de palma, o mais procurado em todo do mundo, os habitantes da Amazônia vivem ameaçados pelo crescente desmatamento e especulação para este lucrativo cultivo.


EFE/Barbara Walton

“Já não temos acesso ao território de uso ancestral, foi arrasado pela exploração”, explicou em entrevista à Agência Efe Carlos Hoyos Soria, fundador da Comunidade Nativa de Santa Clara de Uchunya (Ucayali), assentada em plena floresta amazônica.

Hoyos foi a Washington, junto com outros membros da sua comunidade, para pedir à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que se reconheça o lugar no qual seu povo habita e assim seja protegido contra a expansão dos cultivos de palma.

O negócio não para de crescer no Peru desde 2012, uma vez que os solos de Malásia e Indonésia deixaram de ser rentáveis para a demanda incessante do produto.

Em cosméticos, alimentos e inclusive como combustível para veículos, o óleo de palma está presente em quase tudo, mas seu surgimento no dia a dia das comunidades indígenas do Peru sacudiu milhares de pessoas que, pelos interesses em suas terras férteis, podem perder suas casas e até mesmo a vida.

“Não somos contra o investimento, só queremos que o Estado nos conceda a titularidade do território ancestral da nossa comunidade para estarmos a salvo da especulação e do tráfico de terrenos”, relatou Hoyos.

Segundo sua versão, os traficantes de terras, interessados em comprar solo fértil para vendê-lo às companhias agrícolas, abriram fogo enquanto ele vigiava os arredores da sua casa, mas as ameaças aumentaram: um morador da sua comunidade teve que fugir depois que queimaram completamente sua casa.

“Vivemos da caça e da pesca, a natureza nos dá alimentos, remédios e educa nossas crianças”, contou Hoyos, com vestimenta tradicional, enquanto tenta transmitir na capital americana a filosofia com a qual vive entre as árvores amazônicas.

Esta comunidade quer resolver o problema de forma diplomática antes que o sangue chegue ao rio, já que, como lembrou Hoyos, “quatro irmãos de outro assentamento foram assassinados a tiros”.

“Somos um povo pacífico, não queremos chegar a esse ponto”, ressaltou.

Álvaro Másquez, advogado do Instituto de Defesa Legal a cargo da Área de Povos Indígenas, acompanha a comitiva em sua viagem a Washington.

Durante uma audiência solicitou à CIDH que visite a comunidade e que transmita ao Estado peruano seu pedido, assim como que solicite informação sobre os processos judiciais abertos contra os responsáveis por agredir e amedrontar indígenas, advogados e ativistas.

Este advogado lembrou que vários juízes rejeitaram suas denúncias até que o Tribunal Constitucional concordou em revisar o caso, que será resolvido no próximo ano, abrindo um espaço para a esperança.

“Uma decisão favorável poderia solucioná-lo, mas só abre oportunidades administrativas”, destacou Másquez.

Carlos Reaño, procurador do Estado Peruano, lembrou à CIDH que há precedentes no Tribunal Constitucional com resolução positiva, já que o artigo 89 da Carta Magna considera que as comunidades nativas podem fazer uso do território.

“Há coisas que podem ser melhoradas”, concordou o representante do Estado, ao mesmo tempo lembrando que “a personalidade jurídica da comunidade não encontrava-se inscrita”.

Mas o Estado parece não ter a única responsabilidade da preocupação destas famílias. Segundo Jamer López, representante da Federação de Comunidades Nativas de Ucayali, o governo regional deu terras a especuladores, e alguns funcionários se beneficiam da atividade das empresas.

López também criticou que as denúncias de abusos denunciadas em delegacias e órgãos locais abrem investigações que “não chegam a conclusões”.

Eles aguardam que o Tribunal Constitucional se pronuncie e que o Estado peruano termine de elaborar um Plano de Desenvolvimento Sustentado para a Palma, além de esperar que a CIDH elabore o relatório que anunciou semana passada.

Enquanto isso, a vida de mais de 1.300 comunidades vai continuar alterada devido ao óleo mais polêmico, mas mais usado do mundo desenvolvido, alertou López.

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