Por David Biello - Scientific American Brasil
O ovo de galinha tem uma história destacada na medicina. Mesmo hoje em dia, injeta-se o vírus da gripe em milhões deles para fabricar vacinas. Agora, cientistas do instituto Roslin, na Escócia (o mesmo que clonou a ovelha Dolly), produziram um galo geneticamente modificado cujas descendentes fêmeas põem ovos que produzem medicamentos no lugar de uma proteína na clara do ovo.
Helen Sang, do Instituto Roslin, e seus colaboradores usaram lentivírus para introduzir dentro de embriões um gene que ativa a produção de diversas drogas em vez da proteína ovalbumina, que em geral compõe cerca de 54% da clara. Os pesquisadores procuraram entre os frangos resultantes aquele que produzia o novo gene em seu sêmen. Depois, fizeram o cruzamento dele com galinhas normais para produzir novas aves que carregassem o gene inserido e produzissem medicamentos nas claras de seus ovos.
Testes com os ovos mostraram que elas podiam produzir o miR24 (anticorpo monoclonal usado no tratamento do melanoma) ou interferon b-1a (proteína do sistema imunológico usada contra esclerose múltipla, entre outros males) dependendo de qual gene fosse inserido. As galinhas produzem de 15 a 50 microgramas de medicamento por milímetro de clara, e embora isso não seja tão eficiente quanto a expressão da ovalbumina, é eficaz o suficiente para permitir a purificação subseqüente para drogas terapêuticas.
"Esperávamos que o transgene não fosse tão eficiente quanto o gene endógeno no qual ele foi baseado, pois apenas alguns dos elementos regulatórios foram usados e o transgene pode ter sido inserido no cromossomo numa posição que não favorece a expressão máxima", observa Adrian Sherman, do Roslin, que também participou da pesquisa. "Estou certo de que há potencial para aperfeiçoamento."
Os ovos de galinha podem ter vantagens sobre outros produtos geneticamente modificados, como leite de cabra. As galinhas são fáceis de criar, produzem numerosos ovos e são baratas de manter. E após criar cinco gerações de aves modificadas, os pesquisadores não observaram nenhum efeito adverso à saúde, de acordo com um artigo publicado online em 15 de janeiro na Proceedings of the National Academy of Sciences USA.
Apesar de as proteínas terapêuticas terem funcionado como esperado em ensaios in vitro, levará anos para que o processo resulte em remédios para consumo humano, dizem os pesquisadores.
As galinhas de Roslin somam-se a um esforço semelhante que emprega células tronco desenvolvidas pela Origen Therapeutics. Independentemente de qual "biofábrica" for a primeira a se tornar viável comercialmente, um novo uso medicinal para o venerável ovo está agora evidente.