“É preciso recuperar a força do Ministério do Meio Ambiente”

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Ex-senadora pede que Dilma cumpra promessa de campanha e vete o Código Florestal 

Ruy Barata Neto e Pedro Venceslau - Brasil Econômico

Os mais de 20 milhões de votos recebidos na última eleição presidencial credenciaram a exsenadora Marina Silva (PV-AC) como uma das mais influentes interlocutoras políticas da terceira via brasileira. Apesar de viver um momento de crise interna em seu partido e de não contar com um cargo público que lhe garanta os holofotes, ela tem sido figura chave no controverso debate em torno do projeto que prevê mudanças no Código Florestal Brasileiro. Marina cobra de Dilma uma promessa feita durante a campanha, quando ela e seu adversário, José Serra (PSDB-SP), miravamos votos verdes no segundo turno. 


“O acordo que foi feito entre a base do governo, a bancada ruralista, o PSDB e o DEM não substitui o compromisso da presidente Dilma de não sancionar qualquer projeto que promova o aumento do desmatamento”, diz Marina. “E o projeto do Aldo Rebelo já promove o desmatamento antes mesmo de ser aprovado”. 

Nesta entrevista, concedida no calor do debate sobre o projeto de lei, ela critica Rebelo, pede a Dilma que rejeite as mudanças no Código e desconstrói o projeto de Gilberto Kassab de lançar um candidato de seu partido para sucedê-lo.
 
Os argumentos dos ruralistas em defesa da alterações no Código Florestal dizem, por exemplo, que sem mudanças não seria possível produzir arroz no país, já que essa cultura é majoritariamente de regiões de margens de rio. Como a senhora responde a isso e à questão dos pequenos agricultores?

 
Esse discurso é semelhante ao do cabo da enxada. Toda vez que a gente falava em Código Florestal na Amazônia, as pessoas diziam: “Agora o agricultor não pode mais tirar uma madeira para o cabo da enxada”. Quais são os interesses que estão sendo ocultados por trás dos pequenos agricultores e de algumas culturas seculares, como café e a maçã? Será que essa generalização é verdadeira? 


Existem casos que devem ser tratados como exceção. As exceções devem ser contempladas. 

Acredita em um veto do governo ao projeto do Código Florestal?
 
Eu espero um veto. O acordo que foi feito entre a base do governo, a bancada ruralista, o PSDB e o DEM não substitui o compromisso assumido pela presidente Dilma diante do povo brasileiro, que foi de não sancionar qualquer projeto que promova o aumento do desmatamento. E o projeto do deputado Aldo Rebelo está promovendo o desmatamento antes mesmo de ser aprovado. Desde 2005 o desmatamento vinha caindo graças ao plano que foi feito na minha gestão. Tivemos que enfrentar verdadeiras quadrilhas criminosas de grilagem de terra e de exploração irregular de madeira. Com a expectativa de tornar legal o ilegal, a tendência é que eles voltem com toda a força. Estão dizendo que podem construir nas margens de rio, que podem construir nas declividades e topos de morro, que podem fazer o que antes era ilegal. É lamentável o que está acontecendo no Brasil. Estamos andando para trás.

 
Aldo Rebelo representa o que há demais atrasado no nacionalismo primitivo. Ficou magoada com as colocações de Aldo Rebelo, que acusou seu marido de ter fraudado contrabando de madeira?

 
Não é questão de ficar chateada, eu fiquei foi perplexa mesmo. Esperava isso de qualquer ruralista comprometido com aqueles grupos, mas não do Aldo Rebelo. Vou entrar com uma interpelação judicial. Pedi que o Ministério Público investigue as acusações levianas que ele endossou e foram feitas por pessoas que foram combatidas durante aminha gestão. Aldo mais do que ninguém sabia que as acusações eram levianas, mentirosas e com tentativa de intimidação. Ele usou o mesmo caminho das pessoas que tentaram me intimidar, mas não conseguiram.Depois de enfrentar a máfia, eu não poderia ter outro troco senão dossiês apócrifos.

 
Ficou surpresa coma aliança entre o PCdoB e os ruralistas?

 

Não vou generalizar que essa posição seja de todo o PCdoB. Não quero cometer injustiças. Acredito que há muitas pessoas dentro do partido que estão constrangidas com o papel do Aldo em favor destas teses retrógradas e atrasadas. Se essa tese (ruralista) tivesse sendo defendida por alguém com outra origem, talvez tivesse menos chance de prosperar dentro do governo e no Congresso.

A senhora foi recebida pelo ministro Antonio Palocci no meio da negociação do Código. Existia então uma tendência de o governo resistir à anistia aos desmatadores. Como essas acusações contra o ministro podem prejudicar a posição dos ambientalistas?

 
Lamentavelmente o acordo entre governo e ruralistas surge em um contexto muito ruim: as denúncias sobre o enriquecimento do Palocci e a convocação dele para se explicar no Congresso, a MP de dispensa de licitação nos investimentos das Olimpíadas — que é gravíssima — e o inventivo para a energia nuclear. As coisas estão sendo decididas entre PSDB,DEM e ruralistas.


Uma proposta do governo seria o melhor caminho?
 

Desde a campanha eu dizia que o melhor caminho era uma proposta do governo para termos uma política nacional de florestas. Só assim teríamos uma política para a proteção e o uso sustentável da floresta. O plano que vinha dando certo há cinco anos foi desconstruído. É preciso recuperar a força do Ministério do Meio Ambiente, para que ele não fique à deriva de toda essa avalanche que está aí.
 
Por que o governo não apresentou uma proposta?

 
Essa é a pergunta que devemos fazer. Por que o governo deixou o deputado Aldo reinar absoluto em torno desta questão no Congresso? O governo não apresentou uma alternativa quando tinha toda a legitimidade para isso.
 

A que atribui a perda de força do Ministério do Meio Ambiente?
 
Quando saí, estavam tentando induzir o presidente Lula a um erro. O Mangabeira Unger e o ministro da Agricultura, juntamente com o governador Blairo Maggi e o governador de Rondônia queriam convencer o presidente que os dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) sobre desmatamento estavam errados e que os certos eram os dados da secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso, que tinha sido recém-criada. Isso era usado para revogar as medidas que tinha tomado, como o embargo das áreas desmatadas ilegalmente, vedação do crédito para os ilegais e criação de uma lista de quem não devia receber financiamento. Naquele contexto eu pedi para sair.
 

Acha que a oposição podia ser mais presente nesse debate?
 

O que nós precisamos é de posição dos partidos e do governo.
 
O que acha do desempenho do PV no debate?
 

Na questão do Código Florestal, a bancada está unida. Existem deputados do PV que defendem energia atômica. São casos dissonantes, fruto de uma cultura do PV de aceitar pessoas sem alinhamento ideológico e político. Historicamente temos militantes ambientais como o Zequinha (Sarney), o (Fernando) Gabeira e o (Alfredo) Sirkis...
 
E o José Luis Penna, presidente do Partido Verde?
 

É um militante socioambiental, mas tem uma visão equivocada de partido, que permite que tenhamos pessoas que defendem a energia nuclear. A democracia interna do PV precisa mudar. O PV precisa ser atualizado e com uma estrutura horizontal. Os filiados do PV não escolhem seus dirigentes. É um sistema de nomeações, o que deixa o partido vulnerável. O PV não foi capaz de inovar sua estrutura. Precisa de uma organização em rede.
 
Cogitou formar outro partido?
 

Estou focada na discussão dentro do PV. Espero que as escolha dos dirigentes seja direta. Não posso concordar com um partido em que, no Amazonas, as pessoas se identificam com o Amazônico Mendes, que distribuiu motosserra na campanha, nem com o apoio do partido ao Ivo Cassol. Todos conhecem suas práticas em Rondônia.
 
A senhora aprova uma eventual aliança com Gilberto Kassab?

 
Eu ainda não discuti essa questão. O pior dos mundos é passar a ideia que o PV terá um candidato do Kassab. O Partido Verde faz uma discussão interna com três quadros: Eduardo Jorge, Fábio Feldman e Ricado Young.

 
O Fábio Feldmann não aceitou o convite para disputar a prefeitura. Ele defendeu o nome da senhora para tentar o cargo.


(risos) Fábio é meu amigo. Sou filiada no Acre e não pretendo mudar meu domicílio. Também falaram isso sobre Belo Horizonte.

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