Investigação do Greenpeace mostra que empresas estão consumindo os últimos estoques de madeira da região oeste do Pará, onde estariam 25% do total de assentados pelo Incra em 2006.
Manaus, AM – Denúncia do Greenpeace mostra que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) facilitou a atuação de empresas madeireiras em áreas de assentamentos rurais na região de Santarém, no Pará.
Levantamentos de campo e documentos comprovam que o órgão estimulou o estabelecimento de parcerias entre madeireiras e supostas associações de assentados, em um esquema que prejudica a floresta amazônica e famílias de trabalhadores rurais sem-terra. Isso levou o Ministério Público Federal no Pará a pedir o cancelamento de 99 assentamentos criados na região em 2005 e 2006. A denúncia foi transmitida domingo (19) pelo Fantástico, programa da Rede Globo de Televisão, e publicada hoje no jornal britânico The Independent.
A investigação, realizada nos últimos oito meses, mostra que o Incra acelerou a criação de dezenas de assentamentos nas áreas ricas em recursos florestais para atender aos interesses das empresas madeireiras.
O Greenpeace teve acesso a contratos e atas de reunião de associações de assentados, que revelam detalhes de como funciona essa parceria, batizada localmente de “PPP”, ou “Parceria Público-Privada”. As empresas madeireiras assumem parte das obrigações na implementação dos assentamentos – como a construção de estradas e escolas – que seriam tarefas do Incra.
Em troca, ficam com o direito de explorar a madeira da área. Os acordos também ajudariam o Incra a superestimar o número total de famílias supostamente assentadas em 2006. Das 136 mil famílias assentadas no ano passado, 34 mil estão na região de Santarém.
As irregularidades vão desde a existência de assentamentos-fantasma (que existem no papel, mas não contam com nenhum morador) até a escolha das áreas para criação dos assentamentos. Em depoimentos à CPI da Biopirataria em 2006, madeireiros reconheceram que chegaram, inclusive, a determinar onde os assentamentos deveriam ser criados, escolhendo as áreas com mais disponibilidade de madeira de valor comercial.
“Enquanto setores do governo envolvidos no plano nacional de combate ao desmatamento celebram a queda pelo terceiro ano consecutivo, agentes do mesmo governo colocam em funcionamento uma máquina de assentamentos feitos em estranha parceria com madeireiros para, com o verniz da reforma agrária e de justiça social, garantir a oferta de madeira ao mercado sem sequer beneficiar os supostos assentados”, diz um trecho do relatório do Greenpeace sobre o assunto.
“Em vez de garantir o uso sustentável dos recursos naturais, por meio de planos de manejo comunitário, com assistência técnica, o governo, através do Incra, prefere aceitar a relação de dependência dos assentados com as madeireiras, em troca das benfeitorias que o próprio instituto deveria estar fazendo”, disse André Muggiati, da campanha Amazônia do Greenpeace.
Historicamente, a exploração predatória de madeira abre as portas da devastação da floresta. A Amazônia brasileira perdeu mais de 700 mil quilômetros quadrados de sua cobertura florestal nas últimas quatro décadas. O desmatamento e as queimadas são a principal contribuição brasileira ao aquecimento global. Por causa do desmatamento, o Brasil é o quarto maior emissor mundial de gases que provocam o efeito estufa.
Os acordos entre madeireiros e associações de assentados, com o conhecimento e aprovação do Incra, configuram uma parceria onde quase todo mundo ganha. O Incra ganha o "cumprimento" das metas nacionais de Reforma Agrária. Os madeireiros ganham o lucro da venda da madeira retirada da área de assentamento. Os "assentados" têm a expectativa de um dia ficarem com a terra. Nesse jogo, quem perde mais são a floresta e o clima do planeta.
Texto do Greenpeace.
Fonte: Ecoagência.